Guia prático de agricultura urbana: como cultivar alimentos em grandes centros
A agricultura urbana é uma tendência crescente devido à expansão populacional por todo o globo. Segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU), 55% da população mundial estão concentrados nos centros urbanos, e esse índice deve chegar a 70% até 2050.
Dentre os desafios desse contexto, o que mais se destaca é a questão da segurança alimentar. Afinal, esse fator depende do atendimento a diversos pontos, como acesso, disponibilidade e qualidade de alimentos.
Pensando nisso, preparamos este guia completo contendo todos os detalhes sobre agricultura urbana, seus objetivos e como implementá-la no dia a dia. Boa leitura!
O que é agricultura urbana?
Agricultura urbana e periurbana (AUP) é a prática que envolve técnicas de produção agrícola e conservação dos recursos naturais de maneira sustentável, tanto no núcleo urbano quanto nas zonas periurbanas.
Afinal, as práticas agrícolas, na cidade e no campo, são complementares e estão ligadas ao sistema alimentar local. Inclusive, promover maior disponibilidade de alimentos para a população é um dos principais motivos para que a agricultura urbana seja cada vez mais adotada.
Entretanto, ela não é restrita à produção de hortas, frutas e animais. Sendo assim, pode abarcar plantas medicinais e ornamentais, desde que atendam às especificações de cada uma delas.
É um conceito ainda muito abrangente e em constante inovação com as tendências do agro. Trata-se de uma ótima alternativa, principalmente, em regiões com poucas áreas cultiváveis.
O fato é que AUP será uma realidade cada vez mais palpável nas próximas décadas. O Brasil é um forte candidato para que esse procedimento seja um sucesso.
Exemplo de agricultura urbana: Japão
Um exemplo claro de adoção bem-sucedida é o Japão. O país é composto por um conglomerado de ilhas, com uma área equivalente ao estado de Pernambuco, mas com o triplo de habitantes, além de escassez de mão de obra.
Mesmo assim, ele comprova que a agricultura urbana é um sonho possível e rentável. Em menos de uma década, já foram construídas 50 fazendas agrícolas nas grandes cidades do país, muitas delas verticais, com amplo uso de tecnologia, como drones e robôs.
Um exemplo famoso do país, descrito em diferentes trabalhos acadêmicos, é o edifício Pasona, em Chiyoda-ku, um distrito da capital, Tóquio. Ele combina luminosidade solar e artificial com capacidade para produzir durante todo o ano.
Isso ocorre devido ao rigoroso controle de iluminação, temperatura, umidade, teor de dióxido de carbono e nutrientes nas plantações.
Referência no Rio de Janeiro
Comunidades locais projetam a criação da maior horta urbana do mundo no Rio de Janeiro, a partir do programa Hortas Cariocas. Ela deve ficar pronta em 2024, com o objetivo de tornar o consumo de orgânicos mais popular, além de favorecer a geração de renda a famílias carentes.
Durante a pandemia de Covid-19, esse programa da prefeitura do Rio de Janeiro ajudou a amenizar a situação de insegurança alimentar de milhares de famílias. São mais de 50 unidades de agricultura urbana distribuídas em escolas e centros comunitários.
Quais os objetivos da agricultura urbana e periurbana?
Estudos definem que:
“a agricultura urbana, além de proporcionar o desenvolvimento de meios que podem contribuir para uma melhoria na qualidade de vida das pessoas, também possibilita a ampliação na oferta de emprego, renda e aumento na segurança alimentar da população carente.”
Assim, por ser uma tendência de inovação nas próximas décadas, há um Programa Nacional de Agricultura Urbana e Periurbana do Governo Federal. O principal intuito é fomentar práticas agroecológicas nos espaços vagos da cidade e no seu entorno, gerando uma produção sustentável.
Dessa maneira, ele atua conforme a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, a fim de oferecer disponibilidade de seus produtos às famílias de baixa renda. Foi instituído pela Portaria n.° 467 de 7 de fevereiro de 2018 e estabelece os seguintes parâmetros:
- implantação de hortas urbanas;
- criação de animais de pequeno porte;
- implantação de viveiros;
- desenvolvimento de competências para compartilhar conhecimentos, garantindo que eles estejam relacionados à segurança alimentar;
- fortalecimento das capacidades gerenciais e assistência técnica;
- implantação de hortas pedagógicas em escolas públicas e entidades sociais.
Como resultado, o governo espera potencializar o bem-estar alimentar e nutricional, além de promover inclusão social e autonomia financeira, especialmente, às mulheres. Sem falar em maior educação ambiental, aproximando pessoas do consumo de alimentos orgânicos e naturais.
Como começar?
Deseja implementar o seu projeto de agricultura urbana e periurbana? Saiba que, primeiramente, você deve ser objetivo sobre qual empreendimento comercial estabelecer e seu tamanho. Portanto, considere o tipo de cultivo, a equipe e qual a finalidade.
Para isso, separamos os principais pontos do planejamento. Acompanhe.
Avalie o mercado regional
É crucial estabelecer os detalhes sobre qual cultura será implementada. Por exemplo, se em sua região, as olerícolas são provindas de localidades mais distantes, elas serão mais caras devido ao frete.
Você pode utilizar isso como estratégia para oferecer os produtos e convencer os clientes de que eles terão melhor custo-benefício.
Aposte no trabalho em grupo
A colaboração de diferentes segmentos e órgãos governamentais contribui para a melhor implementação da agricultura urbana. Conte com as instituições sociais, ONGs e cooperativas agrícolas (se houver) para auxiliar na ampliação inicial da produção e divisão da demanda entre os interessados.
Invista em visibilidade
A divulgação é outro ponto-chave. A melhor maneira é pesquisar o comércio local e apresentar sua proposta e vantagens.
Use o marketing do agronegócio a seu favor, para fortalecimento do seu empreendimento e para trazer mais profissionalismo ao seu negócio. Mais à frente, vamos explicar a importância do marketing digital nesse contexto.
Quais as melhores culturas para começar?
A escolha da cultura dependerá da região. Isso porque é possível estabelecer plantações além das clássicas hortas, abrangendo a fruticultura, espécies ornamentais e medicinais. Portanto, avalie se a cultura é adaptada às condições climáticas e se há procura constante por ela na sua localidade.
A boa notícia é que, por ser um país tropical, boa parte das espécies vegetais se desenvolvem bem no Brasil. Em contrapartida, algumas culturas específicas, como morango, pêssego, maçã e pera, necessitam de um clima mais ameno para frutificar.
Além disso, há muitas formas de implementação da agricultura urbana, que permitem diferentes opções de espécies, a depender do tamanho e do objetivo.
Outra dica que pode levar ao sucesso é o cultivo de culturas e espécies vegetais de alto valor agregado, que acabem por trazer maior rentabilidade à operação e tragam a possibilidade da criação de subprodutos.
Quais os tipos de agricultura urbana?
Ela pode ser aplicada diretamente no solo, usando hidroponia, canteiros suspensos ou vasos. Com um bom projeto, nenhuma área disponível precisará ser desperdiçada.
Para ter uma ideia, um dos exemplos mais interessantes é o cultivo do meloeiro suspenso. Ele prova que não importa o tamanho da área: a colheita será uma realidade.
Inclusive, variedades de melão, como cantaloupe, já são totalmente produzidas em ambiente protegido com estufas, e seus frutos são sustentados por redes até a maturação. Isso permite que as plantas sejam direcionadas de maneira vertical, e o espaço, mais otimizado.
Há diferentes classificações de agricultura urbana e periurbana, de acordo com o espaço e o objetivo da produção. Exemplos descritos são:
- fazendas comerciais: com produção intensiva de médio a grande porte;
- fazendas institucionais: voltadas a um público mais específico, como escolas, empresas e asilos;
- agricultura não alimentar: voltada, por exemplo, ao paisagismo;
- fazendas comunitárias: geralmente, de agricultura familiar;
- jardins comunitários: planejados para o cultivo de plantas hortícolas, medicinais e ornamentais, e voltados para atividades de lazer e agroturismo.
Como fazer o plantio de maneira adequada?
Até aqui, você viu como realizar o planejamento para começar a implementação da sua plantação urbana, seja em vasos, seja a irrigada, com suas tecnologias. Agora, explicaremos os principais pontos de manejo para obter o máximo de produtividade.
Preparo para cultivo
Essa etapa dependerá de qual área será utilizada no plantio. Caso seja diretamente no solo, será fundamental realizar análise de suas condições para verificar a acidez e deficiência de nutrientes.
“Muitas áreas urbanas são impróprias para cultivos por estarem poluídas ou contaminadas por metais pesados”, de acordo com publicação da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária).
Por outro lado, se o plantio for em vasos, certifique-se de comprar insumos agrícolas em um fornecedor de confiança.
Além disso, a aplicação de fertilizantes químicos NPK (nitrogênio, fósforo e potássio) nesses recipientes deve ser realizada com cautela. Isso porque a menor área favorece concentração dos sais e pode causar fitotoxidade — ou seja, a reação tóxica que um herbicida provoca na planta e que atrapalha o crescimento.
Para questões como fertirrigação e hidroponia, tendências cada vez mais presentes devido à agricultura de precisão, conte com um engenheiro agrônomo. O profissional passará a recomendação ideal relacionada aos teores de nutrientes.
Vale lembrar que o excesso de minerais pode causar salinização, dificultando a absorção pelas raízes, especialmente, nos casos de aplicação constante de solução nutritiva ao solo. Também leva a problemas da adsorção do fósforo — nutriente indispensável para o melhor desenvolvimento dos frutos.
No cultivo hidropônico, as técnicas mais utilizadas na agricultura urbana são os sistemas de circulação aberta, como o NFT (Nutrient Film Technique, ou Técnica do Fluxo Laminar). Ele se baseia em tanques com soluções nutritivas, canais de cultivo em PVC e bombas para promover circulação dos nutrientes.
Escolha as culturas a serem implementadas
A seleção das cultivares estará sempre atrelada à sua estratégia comercial. Afinal, de nada adianta você plantar salsa em regiões em que os hábitos culturais preferem coentro.
Nessa etapa, também avalie o planejamento a curto e longo prazos para que o seu investimento não se torne prejuízo. Isso engloba o manejo integrado de pragas e doenças, os fatores climáticos e a demanda do mercado. Dessa forma, será possível lidar da melhor com imprevistos.
Como fazer o manejo da pós-colheita?
É ideal que a colheita dos alimentos aconteça nos períodos mais frescos do dia, para preservar a qualidade dos produtos. Além disso, é preciso ter cautela para não colher após chuvas intensas.
Outro fator a se considerar é a atenção a quaisquer quedas excessivas das frutas e hortaliças, bem como evitar o superenchimento das caixas no campo. Mais um ponto fundamental são os danos mecânicos, principalmente, em frutas como morango, ameixa e cereja.
As embalagens mais indicadas são caixas plásticas limpas e desinfetadas, que devem ser transportadas com rapidez para seu próximo destino. Para melhor entendimento sobre esse tema, o manejo é subdividido em duas etapas:
- fatores pré-colheita — envolvem as condições climáticas regionais, espécies e variedades cultivadas, os tratos culturais e fitossanitários inadequados, como a superdose de adubação nitrogenada e o uso inadequado de defensivos. É preciso ter atenção redobrada, a fim de evitar prejuízos;
- fatores colheita e pós-colheita — estão relacionados a transporte, manuseio, tratamento fitossanitário e climatização/destanização, bem como à embalagem e ao armazenamento, sendo esse último o mais importante. Afinal, se os produtos forem mal acondicionados, isso poderá comprometer toda a operação, causando sérios prejuízos.
Como comercializar a produção?
Muitos agricultores urbanos buscam aumentar sua renda investindo diretamente nas etapas de processamento e comercialização de seus produtos. Contudo, a maioria não dispõe dos meios financeiros para fortalecer o próprio negócio ou não faz um planejamento eficaz no mercado.
Portanto, um conceito indispensável que auxilia na construção de uma melhor logística e definição de estratégias na produção agrícola é a cadeia de valor. De maneira sucinta, ela se refere a todas as tarefas necessárias para a produtividade em benefício à sociedade.
Por exemplo, um grupo ou cooperativa de agricultores pode ser formado para contribuir com fabricação, processamento e comercialização dos alimentos. Ou seja, a participação de cada um no processo aumenta o valor final do resultado.
Essa definição contribui para a melhor compreensão do fluxo de produção e otimiza o progresso de qualquer item, desde o local de origem até o comprador final. Para isso, analisa os gargalos na cadeia e aprimora as ligações entre os múltiplos agentes relacionados (fabricantes, fornecedores, comerciantes, processadores etc.).
Use o marketing digital ao seu favor
Uma estratégia que contribui com o maior fortalecimento da cadeia de valor e impulsiona a comercialização é ficar por dentro das técnicas do marketing digital. Apesar de parecer distante do homem do campo, o fato é que a internet está cada vez mais presente nas nossas vidas.
Esse benefício pode ser utilizado na sua localidade com divulgação dos seus produtos para expandir seu alcance junto aos demais comerciantes. Para que essa tática surta efeito, é preciso estudar qual o principal veículo de comunicação dos seus clientes.
De acordo com dados da ABMRA (Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio), quase todos os produtores rurais possuem smartphones e 76% utilizam o WhatsApp como principal canal de comunicação e de informação.
Portanto, crie uma abordagem com assistência por meio do aplicativo para se manter sempre disponível aos seus clientes. Inclusive, com a modalidade WhatsApp Business, você poderá deixar disponíveis catálogos, horários e pontos de atendimento, bem como prospectar clientes da melhor forma.
Além disso, será possível criar grupos para melhor divulgação dos produtos e formar uma rede de contatos de trabalho. Essa dica serve, especialmente, para produtores iniciantes na agricultura urbana para clientes residenciais.
Feiras e mercados dedicados a hortifrutigranjeiros também são ótimos meios de comercialização. Muitos consumidores preferem esses ambientes, em relação aos mercados regulares, motivados pelo desejo de ter alimentos frescos e orgânicos, além da conscientização crescente sobre os benefícios de uma dieta saudável, rica em vegetais.
A agricultura urbana e periurbana será uma realidade cada vez mais intrínseca à rotina dos grandes centros e, à medida que a tecnologia avança, trará ainda mais bons frutos. Afinal, essa tendência é um verdadeiro sucesso no mundo, com implementação até de telhados verdes — sistema em que é possível cultivar alimentos ou plantas ornamentais na cobertura de uma casa!
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